No início de Gilmore Girls, Rory Gilmore é o exemplo da filha perfeita: uma menina quieta, leitora voraz, estudiosa, gentil com todos, com uma relação única com a mãe e ainda um tanto ingênua. É fácil gostar dela e muitos se identificam com a personagem.
Filha de Lorelai Gilmore, Rory cresce em Stars Hollow, uma cidade pequena, pacata e cheia de vizinhos peculiares. A série tem como pano de fundo a história de uma mãe que engravida na adolescência, deixa a casa dos pais por não compactuar com estilo de vida de classe alta baseado em aparências e status, e decidiu criar a filha sozinha.
A trama começa quando Rory, aos 16 anos, é aceita na prestigiada e concorrida escola de elite, Chilton, passo importante para seu sonho de infância: cursar Jornalismo em Harvard. Lorelai, muito orgulhosa, faz o possível para apoiar os sonhos da filha, porém, como gerente de um hotel, não tem condições de pagar uma escola caríssima. A solução é recorrer aos seus pais. Assim, Lorelai engole o orgulho e pede ajuda a eles, oportunidade que os avós veem como forma de reatar os laços familiares.
Com o tempo, no entanto, o encanto em torno de Rory começa a se dissipar. O público passa a vê-la como mimada, egocêntrica e, em certos momentos, incoerente com os valores que a série inicialmente defendia. Há alguns motivos e teorias para explicar essa mudança: alguns dizem que a atriz Alexis Bledel (Rory), que contracena com Lauren Graham (Lorelai), deixa a desejar em sua atuação, sem conseguir transmitir sinceridade em momentos de crise. Outros apontam questões do próprio roteiro, que afastam a empatia do público.
Dean x Jess: o triângulo que marcou a virada de Rory
Um dos primeiros grandes conflitos que dividem os fãs da série surge com a chegada de Jess Mariano, sobrinho de Luke, dono da lanchonete da cidade e amigo próximo das Gilmore. Nessa fase, Rory ainda estuda em Chilton e namora Dean, apresentado desde o primeiro episódio como o típico “bom rapaz”: educado, carinhoso e dedicado. Jess, por outro lado, é o oposto: inteligente, mas rebelde, e desperdiça todo seu potencial agindo como se nada realmente importasse.
Desde o início, a química entre Rory e Jess é evidente, perceptível até para Lorelai (que desaprova) e para o próprio Dean. Esse triângulo amoroso, embora clichê, se torna o prelúdio da “queda” da personagem, principalmente pela forma como Rory conduz a situação de maneira irresponsável e até insensível.
Em vez de terminar com Dean, insiste no relacionamento até colocá-lo em uma posição insustentável, culminando em uma cena constrangedora em Stars Hollow, quando Dean a expõe publicamente em uma crise de ciúmes. O episódio escancara o lado mais egoísta e imaturo de Rory, um comportamento que, a partir dali, só piora e se repete ao longo das temporadas. E, bom… nem precisamos lembrar o que acontece quando o Dean volta, né?
Rory e a crise da menina prodígio
No fim dos anos em Chilton, o dilema da faculdade toma conta da trama. Embora sempre tenha sonhado com Harvard, Rory acaba escolhendo Yale. Uma decisão que, para muitos fãs, marca o verdadeiro início de seu declínio.
Nessa fase, seus valores passam a se alinhar aos dos avós e se afastam dos de Lorelai. Rory não sente necessidade de se afastar da vida de elite e cheia de privilégios. Exemplos claros: sua reação desproporcional a uma crítica no jornal universitário (mais preocupada com sua imagem do que com o impacto causado) e a cena em que tenta pagar para ter uso exclusivo de uma árvore no campus…sim! Você entendeu direito. Uma árvore, um espaço público para todos os alunos que, em sua cabeça, lhe pertencia.
É a partir daí que a “menina prodígio” começa a ruir e é substituída por uma Rory mais vaidosa e desconectada da realidade.
Ser boa estudante nunca foi garantia de ser boa profissional
Na vida adulta, Rory consegue um estágio em um grande jornal, cujo dono é o pai de seu namorado Logan, o típico estudante rico que nunca sofreu consequências pelos próprios atos. Animada com a oportunidade, ela acredita estar no caminho para se tornar uma jornalista renomada.
No entanto, ao receber um feedback duro do editor, um profissional renomado e arrogante, mas com experiência e um faro para talentos, ela é chamada de “mediana” e orientada a reduzir suas ambições. Para muitos, isso seria apenas um alerta duro, mas não definitivo. Para Rory, foi devastador. Ela abandona a faculdade e toma decisões impulsivas que a levam até diante de uma juíza e a cumprir muitas horas de trabalho comunitário.
O arco representa o maior conflito entre mãe e filha. Lorelai tenta fazê-la mudar de ideia, mas Rory insiste e se refugia na casa dos avós. Só com a volta de um personagem do passado, em uma das cenas mais icônicas da série, Rory recebe o choque de realidade necessário para retomar os estudos e reconstruir a relação com a mãe, em uma espécie de ato de redenção.
Mal escrita ou um retrato brutal da realidade?
A trajetória de Rory divide opiniões: há quem culpe a criação superprotetora de Lorelai, quem critique a atuação contida de Alexis Bledel em momentos-chave e quem defenda que Rory é, na verdade, um retrato fiel da vida real. Afinal, ser inteligente e esforçada não garante sucesso.
O fato é que, gostando ou não da personagem, Gilmore Girls segue sendo uma série icônica. Com sua estética de outono, diálogos afiados e xícaras intermináveis de café, conquistou milhões de fãs que acompanharam a história de duas mulheres distintas, mas unidas pelo laço inquebrável entre mãe e filha.
25 anos depois, a série ainda desperta debates e relembra como Rory, antes uma menina encantadora, acabou se tornando, para muitos, uma das personagens mais irritantes da TV. Entre uma xícara de café e outra, Gilmore Girls nos lembrou que crescer dói e que nem mesmo as meninas prodígio estão imunes à vida real.
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O artigo acima foi editado por Beatriz Martins.
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