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This article is written by a student writer from the Her Campus at Casper Libero chapter.

No dia 13 de março, o cantor de rap Djonga surpreendeu a todos após o lançamento do seu novo álbum “Nu”. O rapper segue a tradição de lançar um disco no mesmo dia todos os anos, desde o lançamento de “Heresia”, em 2017. Cantando sobre racismo e sempre trazendo debates sociais em suas músicas e composições, “Nu” não foi diferente.

Ganhador do prêmio BET Hip Hop Awards, Djonga fez história no rap nacional, sendo o único brasileiro da edição a erguer a premiação ao lado de nomes do hip hop e do rap internacional, marcando toda uma geração.

Conforma divulgado no portal UOL, Djonga afirmou que o novo disco talvez nem viesse em 2021, mas sentiu a necessidade de fazer, visto que, dentro das letras, o propósito é bem dado.

Em dezembro, o cantor tornou-se alvo de polêmicas ao dar um show no Baile da VJ, no Complexo da Maré/RJ. Após isso, uma enxurrada de críticas vieram à tona. O rapper sumiu das redes sociais e das entrevistas, voltando com tudo em uma obra de arte musical.

A capa do álbum baseia-se na cabeça de Djonga em uma bandeja, decapitado. O vídeo de divulgação, publicado em suas redes sociais, mostra o cantor em uma guilhotina. O rapper revelou em entrevistas que é dessa maneira que ele se sente, capturado e entregue, exposto a julgamentos onde, por qualquer erro e por raízes sociais racistas, ele tem “sua cabeça entregue a todo mundo”.

“Nu” entra como um disco pessoal, onde o cantor traz à tona questões pessoais, mas sem deixar de lado a sociedade. O disco começa com “Nós” e termina com “Eu”, uma jogada incrível e que faz todo sentido. Confira, a seguir, a análise de cada música do novo álbum:

Nós

A música começa com uma narração, um monólogo de Djonga, que arrepia logo nos primeiros segundos. “Outro dia eu me vi perdido. Chorando por algo que outro alguém me causou. Em minha direção veio um mano e disse: A gente nasce sozinho e morre sozinho. A gente nasce sozinho e morre sozinho. Eu não quis acreditar. Eu não quero acreditar. Eu não vou acreditar. Até aqui, tudo foi por nós. É nós, é nós”, introduz durante a composição.

Com um beat acelerado, Djonga traz a perseguição, agregando política à letra. Diz sobre como seu sucesso o fez crescer no meio musical e dentro da cena, mesmo com todos querendo derrubá-lo. Porém, em meio aos versos, diz muito sobre estar sozinho, em meio à fama e ao dinheiro. Ele cita o pai, que faleceu. Conta que a música o afastou dos possíveis caminhos errados, mas que isso não o preencheu por completo. “Meu coração parece um balde furado. Acho que o vazio me pegou em cheio”, finaliza a canção.

“Nós” vem com uma carga emocional muito forte, mas sem perder a sua marca principal, falando sobre a periferia e suas próprias origens. Conta sobre como isso o fez crescer, mas que o dinheiro não era tudo. Uma passagem mais melancólica, sem deixar a música desacelerada. Ele traz o verdadeiro Djonga em sua essência, sem o luxo e sem a fama, inaugurando o álbum com muita maestria.

Ó quem chega

Com um ritmo mais acelerado, Djonga fala sobre algumas pessoas que cruzaram seu caminho, algumas interesseiras, e sobre o fato de ter sumido da cena do rap por um certo período. Porém, o assunto principal é sobre aqueles que nunca o ajudaram, mas tentaram embarcar dentro do seu sucesso. O refrão é para contar que “aqueles que não viram seu passado, querem viver agora”.

É uma crítica pessoal direcionada àqueles que, em suas maiores dificuldades, não o assistiram, mas, por outro lado, queriam usufruir dos luxos e das coisas boas que seu sucesso trouxe. Mesmo sendo uma música que traz pouca mensagem social, funciona mais como um desabafo do cantor, sem perder o beat acelerado.

Xapralá

Mais um som que fala sobre o sofrimento de Djonga no passado e seu reconhecimento de onde está agora. O que mais se destaca em seus versos são as referências aos personagens externos, uma marca de Djonga, que sempre busca figuras para exemplificar aquilo que aborda em sua história.

O nome escolhido para essa é o de Lucas Penteado, um garoto negro e da periferia, que foi humilhado em rede nacional durante o programa Big Brother Brasil e, após se livrar disso, recuperou-se e começou a escrever sua carreira. A alusão ao Lucas é revelada durante os versos, onde o cantor mostra que, o fato de ser negro e muito pobre no passado o fez passar por constantes humilhações, mas que ao construir seu reinado, conseguiu deixar tudo para traz, mesmo sem deixar de ter medo. Djonga orna exemplos da realidade com perfeição e, simultaneamente, sem afastar sua essência pessoal.

Me dá a mão

Com um tom mais triste e uma energia mais amorosa e lenta, Djonga apresenta alguns defeitos seus e lembrando, novamente, das suas conquistas. Apesar disso, ele ressalta seus momentos de fraqueza, como em um verso que foi “homem de pouca fé”. Porém, traz à tona uma figura romântica, que o teria ajudado e “lhe dado a mão puxando para cima de um precipício”, como canta. Ele mostra que essa pessoa conheceu seu lado ruim e que, mesmo sendo tão falho, continuou estendendo a mão para ele. Com um beat mais lento, a música traz um pouco das suas famosas “love songs”, uma vertente mais sentimentalista do rap.

Djonga é conhecido por grandes músicas nesse estilo, como “Leal”, “Procuro Alguém” e “1010”, dos seus discos anteriores. “Me dá a mão”, diferente das outras, tem um foco não só no romance, mas seguindo a linha de outras composições de “Nu” e abordando a figura do rapper por trás da fama e do glamour.

Vírgula

Djonga traz algumas abordagens sobre o racismo, que está muito presente em suas músicas, mas sempre com vários recortes diferentes. Um beat mais calmo, que acelera com o passar da música. Por superar todas as dificuldades que a sua cor da pele e sua condição impuseram, o rapper diz como se tornou o “herói da quebrada” e o “terror do sistema”.

Ele afirma nunca precisar de ajuda para impor esse respeito, com a sensação de missão cumprida ao ver vários que se espelham nele e de saber que muitos, da mesma origem, o vêem como alguém poderoso e inspirador. É uma música mais curta que as outras, mas que agrega a si uma sensação de gratidão inserida.

Ricô

Djonga conta a história de um personagem, o “Rico”, que era visto como o “rei do camarote”, mas não era uma pessoa boa. Era um homem mesquinho, que só vivia por conta de seu sucesso e baseava toda sua personalidade nisso: em mulheres, dinheiro e ostentação. Durante a narrativa, o personagem cruza um bandido que não suportava ele, dizendo que “voltava preso, mas não humilhado”, vendo a figura do “rei do camarote” como uma ameaça. Ele afirmava que “quem quer tudo fica sem nada” e, com isso, acaba matando Rico com o disparo de uma arma.

Djonga traz, por meio dessa narrativa acelerada, uma mensagem escondida nas entrelinhas. Ele mostra que, na verdade, dinheiro não é tudo na vida de alguém e que para o caixão, aquele que esnobava, não levaria nada.

É uma crítica bem pensada, mostrando que muitos deixam o dinheiro subir à cabeça e se esquecer do resto, mas a qualquer momento, o dinheiro torna-se apenas uma nota de papel.

Dá pra ser?

Com a presença de voz feminina da rapper Budah, Djonga traz uma melodia mais calma, ornando com a sonoridade da cantora ao fundo. Mais uma vez, ele traz um tom mais romântico quando desabafa para sua amada, dizendo sobre suas inseguranças, mas que faria de tudo por ela, prezando pela sua liberdade.

Ele traz referências externas novamente, agora de uma forma literária, comparando os olhos de sua amada aos de Capitu. Budah entra no meio da música como se respondesse às falas do rapper, afirmando que, mesmo com suas dificuldades, será seu suporte.

Djonga mescla o beat do rap com um “chorinho” da bossa nova, trazendo uma energia mais calma e ressaltando a importância do amor, mesmo quando as dificuldades pessoais de cada um são o assunto principal.

Eu

A última música do disco e a mais marcante. O álbum começa com “Nós” e termina com “Eu”. Um autorretrato de Djonga, que mesmo sempre falando do social, entrega muito de si.

A música começa de forma marcante, assim como a primeira. São sonoras de manchetes jornalísticas sobre o cantor, desde notícias sobre ter obras voltadas ao anti-racismo e o seu prêmio, agregando uma sonora crítica, onde diziam que ele trazia a falsa noção de representatividade para jovens de periferia e sobre sua polêmica em dezembro de 2020. Enquanto isso, há uma voz de fundo em que o rapper canta sobre o quanto estava só.

Djonga começa a música dizendo que mesmo enquanto cuidava de todos, ele esquecia de si mesmo. Ele canta sobre o fato de se sentir sozinho durante seus versos, contando como o racismo, a perseguição da mídia e seus erros fizeram com que todos quisessem sua cabeça.

No final da música, há um monólogo de uma voz masculina, de alguém mais velho e vivido, como se ela fosse mais experiente, talvez vinda de dentro de si.

Mas, por que “Nu”?

No álbum “O menino queria ser Deus”, o rapper constrói a imagem de Deus. Aquele que, mesmo em meio às dificuldades e ao racismo enfrentado, se sobressai. “Nu” vem como uma desconstrução. Uma ressignificação da imagem de Deus. Djonga é visto, hoje, como um dos maiores nomes e exemplos da cena do rap, como ele se orgulha. “Nu” vem como um soco. Vem como uma forma de mostrar que ele tem seus defeitos e suas inseguranças, mas o dinheiro feito é fruto do seu esforço, nada foi dado facilmente. Fala da solidão e de se sentir sozinho, mostrando com ele é nu, sem mídia.

Como dito antes, o cantor passou por uma polêmica que o tornou vítima do cancelamento das redes socias, onde se tornou alvo de muitas críticas. Mesmo que sua atitude ao fazer o show durante a pandemia não tenha sido correta, outros cantores brancos fizeram o mesmo e não receberam tal represália. Isso demonstra, talvez, como um artista negro, mesmo que renomado, passa por mais dificuldades do que um branco. A imagem da cabeça decapitada na capa do álbum traz a simbologia que todos “queriam sua cabeça”, por conta desse erro.

Com maestria, Djonga traz mais um álbum marcante, assim como todas as suas composições, que mostram a realidade nua e crua.

Ouça o álbum nas principais plataformas de streaming.

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Esse artigo foi editado por Larissa Cassano.

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Izabella Giannola

Casper Libero '23

Izabella is a student of journalism at Cásper Libero. She is passionate about sports, fashion, literature and life. She dreams of representing the power of women in journalism by doing what she loves most.