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Marília Mendonça E Seu Legado No “Feminejo”

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This article is written by a student writer from the Her Campus at Casper Libero chapter.

O artigo abaixo foi escrito por Giulia Lang e editado por Izabella Giannola. Gostou desse tipo de conteúdo? Confira Her Campus Cásper Líbero para mais!

Saiba qual foi o legado de Marília Mendonça no “feminejo”, o impacto de sua carreira e a repercussão de sua morte no exterior

Marília Mendonça: a Rainha da Sofrência

No dia 5 de novembro de 2021, o Brasil recebeu a triste notícia da morte de Marília Mendonça. Com 26 anos, a cantora era uma das vozes mais populares da música brasileira e detinha o título de “rainha da sofrência”. 

O avião que levava Marília para um show em Minas Gerais caiu próximo ao aeroporto, em Piedade de Caratinga. O acidente pôs fim a vida da cantora sertaneja, seu produtor, Henrique Ribeiro, seu tio, Abicieli Silveira Dias Filho, o piloto e copiloto da aeronave. 

A tragédia ainda deixou Léo, de 1 ano e 9 meses, sem a mãe, assim como o sertanejo brasileiro órfão de uma de suas vozes mais simbólicas. Por isso, fixamos aqui uma homenagem à compositora, intérprete, instrumentista, cantora, mulher, mãe, filha, amiga e artista que deixou rastros de sofrência e amor em cada um. 

Marília nasceu no dia 22 de julho de 1995 na cidade de Cristianópolis, criada na capital do estado, Goiânia. Ela teve seu primeiro contato com a música através da igreja e começou a compor quando tinha 12 anos, escrevendo canções para vários artistas, como as músicas “Minha Herança’ (João Neto & Frederico), “Muito Gelo, Pouco Whisky” (Wesley Safadão), “Até Você Voltar”, “Cuida Bem Dela”, “Flor e o Beija-Flor (Henrique & Juliano), “Ser Humano ou um Anjo” (Matheus & Kauan), “Calma” (Jorge & Mateus) e “É Com Ela Que Eu Estou” (Cristiano Araújo). 

Marília se lançou como cantora no ano de 2014, através de seu primeiro EP homônimo. Em 2015, foi lançada a música “Impasse”, primeira canção da cantora que teve a participação da dupla Henrique & Juliano. Porém, foi em março de 2016 através do lançamento do álbum Marília Mendonça: Ao Vivo que contou com os singles ‘Sentimento Louco” e “Infiel”, e mais uma vez a participação da dupla Henrique & Juliano. 

Assim, Marília finalmente ganhou reconhecimento nacional e revelou seu talento ao Brasil. Naquele ano, “Infiel” se tornou a segunda música mais ouvida nas rádios do país. Em outubro, foi lançado o EP acústico ao vivo intitulado “Agora É Que São Elas”, com faixas de sucessos anteriores e tendo como single somente a canção “Eu sei de Cor”. 

Em janeiro de 2017, lançou mais um EP homônimo com quatro faixas inéditas.  Em março, seu segundo álbum nomeado “Realidade”, que teve como singles “Amante Não Tem Lar” e “De Quem É A Culpa” e contou novamente com a participação da dupla Henrique & Juliano. 

Em novembro, “Transplante” em parceria com a dupla Bruno & Marrone. Em julho, Mendonça conquistou o posto de artista brasileira mais ouvida no YouTube, ficando em 13º lugar no ranking mundial. Ainda em 2017, foi indicada ao Grammy Latino na categoria Melhor Álbum de Música Sertaneja devido ao seu álbum Realidade

No ano de 2018, Marília lançou com Maiara e Maraisa o álbum colaborativo  “Agora É Que São Elas 2”, projeto que trouxe músicas em formato acústico e contou com sucessos como: “Ausência” e “Estranho”. 

Durante os anos de 2018 e 2019, com o projeto “Todos os Cantos”, Marília levou shows gratuitos a todas as capitais do Brasil. Em fevereiro de 2019, finalmente lançou o primeiro volume de seu quarto álbum ao vivo denominado justamente “Todos os Cantos”, que tem como singles as músicas “Ciumeira”, “Sem Sal”, “Passa Mal’’, ”Bye Bye”, “Bem Pior Que eu”, “Bebi Liguei”, “Casa Da Mãe Joana” (feat. Henrique & Juliano), “Bebaça” (feat. Maiara e Maraisa) entre tantos outros sucessos. 

 Em maio, foi lançado o segundo volume do álbum que teve como faixas as músicas “Todo Mundo Vai Sofrer”, “Apaixonadinha” (feat. Léo Santana) e “Serenata”. Por fim, foi em agosto que disponibilizou o terceiro volume do álbum com as canções “Supera”, “Intenção” (feat. Gaab) e “Abandono de Incapaz”. 

Ainda em 2019, Marília Mendonça ganhou o Prêmio Grammy Latino na categoria Melhor Álbum de Música Sertaneja, além do prêmio de Melhores do Ano — premiação organizada pela Globo — na categoria Melhor Cantora, e do Prêmio Contigo! Online na categoria Melhor Música do Ano, com a canção  “Todo Mundo vai Sofrer”. 

Mas foi durante a pandemia do Covid-19 que seus números se tornaram ainda mais expressivos. Sua live, realizada em abril de 2020, quebrou recordes mundiais, assumindo a colocação de mais visualizada do YouTube, com 3,2 milhões de espectadores simultâneos. 

Um dia após a sua morte, 6 de novembro, 74 músicas da cantora estavam no Top 200 do Spotify, sendo que 17 delas já ocupavam o Top 50. Com o álbum de estúdio Patroas 35% feito em parceria com a dupla sertaneja Maiara e Maraisa, sendo ele uma continuação do projeto Patroas — projeto colaborativo entre as artistas e iniciado em 2016 —, as faixas “Esqueça-me Se For Capaz” e “Todo Mundo Menos Você” ocupam o primeiro e o segundo lugar do Top 10 das mais ouvidas do Brasil, enquanto a música “Presepada” está em quinto lugar. 

Dessa forma, seus números resultam em 22 milhões de inscritos no canal do YouTube, 14 bilhões de visualizações e 21,3 milhões de seguidores no Spotify. 

Repercussão mundial: jornais internacionais relembraram o sucesso de Marília e a força das letras do “feminejo”

No âmbito internacional, veículos, tanto da imprensa generalista quanto da mídia voltada para a música, destacaram o fenômeno musical que Marília Mendonça representou, como uma potência do “feminejo”. 

O jornal The New York Times ressaltou o sucesso de Marília Mendonça como celebridade da música sertaneja e sua popularidade nas redes sociais. 

“Sua legião de fãs encontrou força em suas letras, que imploravam às mulheres que rejeitassem relacionamentos maus e abusivos, e que contavam a história de personagens falhos”, afirma a reportagem.

Uma das principais revistas de música do mundo, a Billboard também deu destaque para a morte da cantora brasileira com duas publicações em seu site. 

Em uma das reportagens, a revista realça que a cantora chegou à sexta colocação da parada Billboard Social 50 chart, que avalia o desempenho dos artistas entre o público nas redes — número alcançado após o sucesso de uma live em abril de 2021, num dos momentos mais difíceis da pandemia de Covid-19 no Brasil.

Em outra publicação, Marília é descrita como “excelente contralto com uma voz profunda e próxima do soul que trouxe um toque do pop internacional às músicas tradicionais, acompanhadas de acordeão”.

Já a revista People, mídia importante para o mundo das celebridades, chama a atenção para o vídeo “de partir o coração” que exibia as operações dos bombeiros. 

O “Le Parisien”, jornal mais popular da capital francesa, mencionou a amizade que Marília tinha com Neymar — que atua no clube Paris Saint-German. A matéria relembra quando a cantora apareceu, em 2019, de surpresa para cantar “Parabéns pra você” no aniversário do jogador

“Marília Mendonça, que começou no mundo da música com 12 anos, tornou-se conhecida depois de 2015, quando ela lançou seu primeiro EP”, diz o jornal, que relembrou o apelido de “Estrela do Sertanejo” dado à cantora.

O legado de marília mendonça: talento, força do empoderamento feminino e conservação do “feminejo”

O legado de Marília Mendonça na indústria musical do Brasil é indiscutível, dado que em pouco tempo de carreira quebrou paradigmas com uma voz única. A popular “rainha da sofrência” foi também a líder do movimento intitulado como feminejo, com mulheres protagonistas no sertanejo. 

Cantora solo, mãe e mulher fora do padrão estético perpetuado às figuras sertanejas, Marília entoou versos sobre amizade, cumplicidade e valorização entre as mulheres. 

Nesse sentido, a cantora exprimiu os sentimentos e as sensações não só daquelas que foram traídas, enganadas, abandonadas ou que foram “feitas de trouxas por homem”, mas das amantes que também sofrem, assim como das mulheres que imploram para as amigas pararem de sofrer por quem não a quer e seguir a vida.

Canções sobre noites de farra e bebedeira, relacionamentos que caíram na rotina, pessoas que prometem e que após beber descumprem, superação de antigas paixões, recaídas, voltas por cima, amores não correspondidos e amores que deram certo… Todos esses temas estão presentes no repertório de Marília. 

A cantora representava a voz de milhões de mulheres. Exprimia os sentimentos daquelas e daqueles que nem sabiam ao certo o que estavam sentindo. Sua voz, na verdade, era a voz sufocada e retraída de milhões de brasileiros exposta em alto e bom-tom. 

Mesmo que não tenha sido sua intenção principal, é inegável a presença do feminismo no legado de Marília. Ela absorveu, libertou, perdoou, compreendeu e sofreu com as mulheres. Marília ensinou a amar sem culpa, a valorizar a pessoa que você é e a não aceitar somente o mínimo. 

Mostrou que as mulheres podem ir para as noitadas e cobrar respeito e podem ser românticas e da farra também. Mostrou que a figura feminina tem o direito, assim como os homens, de beber e “dar trabalho”, e que também podem errar, trair e se arrepender. Acima de tudo, Marília através de suas músicas demonstrava que as mulheres poderiam ser o que quiserem e como quiserem. 

Suas letras eram mais diretas e sinceras em comparação com outros sertanejos e isso conquistou o Brasil. Marília sabia misturar elementos como a sofrência do sertanejo, balanço do arrocha e o bongô da bachata, mas, em simultâneo, ela dava unidade ao repertório com as letras — maioria sobre sofrência — e a voz encorpada e intensa, além de contar é claro com uma dicção e emissão excelentes. 

Como pioneira em um âmbito majoritariamente masculino, Marília junto a Naiara Azevedo, Yasmin Santos, Simone & Simaria, Maiara & Maraisa abriu portas para que o feminejo pudesse finalmente brilhar. 

Como resultado desse movimento, surgiu também o projeto Patroas — supergrupo de sertanejo formado em 2016 pelas cantoras Maiara e Maraisa e Marília Mendonça. Elas lançaram a turnê “Festa das Patroas” em 2016, viajando pelo Brasil inteiro. 

O projeto empodera as mulheres sobre seus direitos de beber e se divertir. Além disso, também dava voz a temáticas importantes, como violência doméstica. O projeto teve tanto sucesso que evoluiu para um álbum lançado em outubro de 2021 denominado Patroas 35%

O álbum foi elaborado por Marília Mendonça e Maiara & Maraisa como o “trabalho da nossa vida”, com a meta de render uma turnê em 2022, após a pandemia de Covid-19 no Brasil. Porém, Marília morreu semanas após o lançamento do álbum, o que o eterniza como último trabalho lançado por Marília em vida

Ainda rompendo barreiras, Marília levou a força e sagacidade do feminino no sertanejo para trabalhos com Ivete Sangalo, Anitta, Luíza Sonsa e Gal Costa. 

Além de fazer todo mundo chorar com a sofrência — essência de suas canções —, Marília levou libertação, autonomia e soberania às mulheres e inovação para indústria sertaneja feminina. Mais do que isso, levantou multidões, ensinou a dizer não (aos padrões, ao machismo e a objetificação) e mostrou que a música sertaneja também pode  representar as mulheres. 

Não é exagero afirmar que frases como: “me apaixonei pelo que eu inventei de você”; “amar por dois só me dá prejuízo”; “não adianta por graveto na fogueira que não pega mais”, “não receber mensagem também é mensagem”; e “pra bom entendedor, meia ausência basta” marcaram uma geração. 

O legado de Marília Mendonça transcende o empoderamento feminino, e deixa a certeza que seu talento para compor e sua potência vocal ficarão eternizados. Marília Mendonça estava certa ao dizer que “todo mundo vai sofrer”, só não sabíamos que ela não estaria aqui para sofrer conosco. Afinal, doeu demais escutar o seu bye bye…

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Giulia Lang

Casper Libero '24

Brasileira, 18 anos Estudante de jornalismo da Fundação Casper Líbero