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Casper Libero | Culture

As minas estão conquistando a cena do rap e eu posso provar isso! 

Luiza Miranda Student Contributor, Casper Libero University
This article is written by a student writer from the Her Campus at Casper Libero chapter and does not reflect the views of Her Campus.

“Acho bom se conformar que essa cena é das minas. Sem a sua aprovação, já com nome de poetisas.” Quem disse isso foi a N.I.N.A, na música “Poetisas no Topo 3”, e não, ela não está errada: as mulheres estão tomando de assalto a cena do rap, sem medo algum. Assim como a N.I.N.A, rappers como Ajuliacosta, Budah, Tasha e Tracie, Ebony, Duquesa, Mc Luanna e muitas outras estão transformando cada vez mais o “rosto” dessa cultura.

Desde sempre as mulheres estavam presentes no movimento, mas, por decorrência do machismo, tiveram seus trabalhos desvalorizados e precisaram conviver com paradigmas pré estabelecidos pela visão do público masculino. Negra Li, Karol Conka, Flora Matos, entre outras, são grandes exemplos de mulheres que quebraram barreiras e mostraram que podem sim ter voz ativa em um cenário que, a princípio, não foi feito para elas. Hoje, esse preconceito ainda existe, mas a nova geração de rappers mostra-se fruto da força dessas mulheres que deram a cara a tapa no começo desse estilo.

O MOVIMENTO HIP HOP

Popularizado no Brasil nos anos 1980, o movimento Hip Hop foi a maneira que a população majoritariamente jovem e periférica encontrou para se expressar e se fortalecer em uma sociedade desigual e cruel. As questões sociais e culturais são apresentadas com rima, flow e melodia como forma de protesto. Foi o Hip Hop um dos pilares mais importantes na construção do sentimento de pertencimento, reconhecimento e resistência de cidadãos vítimas de um sistema opressor. Os artistas usaram do movimento para gritar com a mesma violência por eles sentida.

Mas as minas queriam mais: elas precisavam de protagonismo feminino para ontem, de vozes que, assim como elas, tivessem problemas além daqueles cantados pelos homens. Foi dessa maneira que o rap feminino se fortaleceu, com a valorização de si mesmas. Se em algum momento elas se privaram da arte, não porque não eram capazes de rimar, mas sim por conta das reações negativas do público masculino, esse tempo ficou para trás. As mulheres estão cantando para outras mulheres e mostrando que o movimento Hip Hop também é delas.

SOBRE O QUE ELAS RIMAM?

As rimas feitas por mulheres abordam os principais desafios enfrentados por elas na sociedade e aconselham quem as ouve. Temas como independência financeira, inteligência emocional, liberdade e, além de tudo, autoestima – principalmente da mulher preta – são os principais assuntos abordados nas letras, e têm mudado a forma como enxergamos o empoderamento feminino.

Tanto em raps quanto em batalhas de rima protagonizadas por homens, é comum ouvirmos rimas que rebaixam as mulheres, sendo a maior parte se referindo à beleza da mulher, sua vida amorosa e sua sexualidade. Por esse motivo, as rappers usam as rimas para manifestar o seu descontentamento com uma cena machista, que procura a beleza antes de seu talento. Em “Classuda”, a Duquesa canta sobre essa questão, reforçando a forma como os homens têm dificuldade em enxergar as mulheres como parceiras de trabalho e valorizá-las, assim como seus “parceiros”.

Atualmente, a lista dos 15 artistas de rap e trap nacional com mais ouvintes mensais no Spotify é composta por homens. Esse domínio masculino causa uma impressão de que as mulheres são minoria, quando, na realidade, a presença delas só tende a crescer cada vez mais. Artistas como Duquesa, Mc Luanna e Tasha e Tracie contam com mais de 3 milhões de ouvintes mensais e 20 milhões de plays no Spotify. Quando comparamos os números de visualizações dos primeiros videoclipes com os últimos lançados nos canais do YouTube dessas mesmas rappers, percebemos um crescimento significativo nas visualizações.

O primeiro vídeo publicado pela Duquesa, intitulado “Futurista”, possui 42 mil visualizações. Já um dos mais recentes, “Turma da Duq”, conta com mais de 10 milhões de plays. As irmãs Tasha e Tracie, por sua vez, têm uma publicação com o título “Wanna Be’s” de 3 anos atrás, com 59 mil visualizações, e seu último videoclipe, publicado há 1 mês, já possui mais de 6 milhões de visualizações.

A CENA INTERNACIONAL

Internacionalmente, as pioneiras do rap feminino foram: MC Sha-Rock, Roxanne Shanté, Queen Latifah, Salt-N-Pepa e MC Lyte. Queen Latifah foi uma das primeiras mulheres a conquistar grande sucesso no mainstream, com faixas que traziam temas como empoderamento feminino e orgulho racial ao rap. Em “U.N.I.T.Y.”, primeira música de rap feita por uma mulher a ganhar um Grammy, Latifah confronta a violência doméstica, assédio e o desrespeito às mulheres no hip hop.

Nos anos 90, Lauryn Hill reforçou e foi reconhecida pela “autoridade” artística das mulheres quando realizou um feito histórico, ganhando 5 Grammys em uma única noite, incluindo: Álbum do Ano, Melhor Artista Revelação e Melhor Performance de R&B, consolidando-se como uma lenda do rap feminino.

Este ano, a rapper Doechii, de 27 anos, foi a única mulher indicada na categoria de Melhor Álbum de Rap com Alligator Bites Never Heal. Ela desbancou J. Cole (Might Delete Later), Eminem (The Death of Slim Shady), Common e Pete Rock (The Auditorium, Vol. 1) e Future & Metro Boomin (We Don’t Trust You), tornando-se a terceira mulher da história a vencer nessa categoria. O álbum, que quebrou o jejum das mulheres no Grammy (que não ganhavam desde a vitória de Cardi B em 2019, com Invasion of Privacy), fala sobre relacionamentos fracassados, crises de ansiedade, pressão dentro da indústria, vícios e muito mais.

MUITO ALÉM DA RIMA: MODA E EMPREENDEDORISMO

Entretanto, a cena do rap feminino ultrapassa as barreiras do mercado musical e se expande para o mundo da moda e empreendedorismo. Assim, essas mulheres assumem o controle de suas trajetórias, fechando contratos com grandes marcas e criando negócios próprios. As artistas não estão apenas cantando sobre empoderamento; elas estão praticando e gritando por mudanças reais enquanto erguem seus impérios.

Júlia Costa é um ótimo exemplo desse processo. Com apenas 15 anos, começou a produzir suas roupas em um CDHU no interior de São Paulo, como forma de conquistar sua independência financeira. Com o tempo, ela conseguiu vender para as garotas de sua escola, gerando renda para produzir outras peças e, assim, começar sua própria marca: “Ajuliacosta Shop”, que está passando por uma nova fase e em processo de construção da loja física. De acordo com o site, “O propósito da marca é empoderar mulheres, trazendo autoestima e confiança quando elas usam as nossas roupas. Ajuliacosta Shop existe para trazer representatividade para as mulheres pretas na moda e acabar com o conceito de moda eurocêntrica.”

Em agosto de 2024, Duquesa, Ebony e Ajuliacosta protagonizaram a capa de uma das revistas de moda mais renomadas do mundo, a Elle. A edição teve como objetivo celebrar o rap feminino e sua ligação com as raízes do hip hop dos anos 80.

As irmãs gêmeas, Tasha e Tracie, criadoras do movimento It Favela, MCs, DJs, estilistas e diretoras de arte, também já foram destaque de outras revistas, como GQ Brasil, Marie Claire e Vogue Business.

O aumento da presença de rappers femininas nas capas dessas revistas tem sido um marco significativo na formação da confiança e autoestima de meninas e mulheres negras que conseguem se enxergar em lugares de destaque. Dessa forma, as minas têm desafiado estereótipos e ampliando a visibilidade da cena do rap, fortalecendo a valorização da diversidade, autenticidade, força e autonomia feminina, além de escancarar que não é apenas um movimento musical, mas sim um estilo de vida. 

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O artigo abaixo editado por Ana Carolina Carvalho.

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Luiza Miranda

Casper Libero '27

Journalism student who loves seeing, listening, reading and writing about art.