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Culture

Dia Nacional da Luta das Pessoas com Deficiência: Acessibilidade em São Paulo, Preconceito e Mercado de Trabalho

This article is written by a student writer from the Her Campus at Casper Libero chapter.

No Dia Nacional da Luta das Pessoas com Deficiência, debates, dificuldades e demandas são retomadas em prol da inclusão de milhões de brasileiros na sociedade.

Daqui a dois dias, plantas irão renascer e flores coloridas tomarão espaço em árvores, gramados e jardins. Serão momentos de renovação e recomeço de um ciclo. E em harmonia com o clima típico de primavera, o dia de hoje foi escolhido para marcar a repetição de outra etapa: em prol da reivindicação da inclusão da pessoa com deficiência no ambiente social.

Desde 1982, 21 de setembro se tornou um constante incentivo para se buscar a integralização social da pessoa com alguma deficiência. Mas só através da Lei Nº 11.133, oficializada no dia 14 de julho de 2005, ficou marcado o Dia Nacional da Luta da Pessoa com Deficiência. Certamente, a condição de vida da pessoa com deficiência mudou, e muito. Aqueles que antes eram escondidos dentro de casa hoje são vistos transitando, se comunicando, criando famílias e redes de amigos. Milhares de pessoas passaram a ser reconhecidas e vistas mais humanamente.

De acordo com dados do Censo de 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil possui mais de 45 milhões de pessoas com alguma deficiência. Pessoas com necessidades, histórias e personalidades distintas. Será que o Brasil de hoje possui estruturas preparadas para atender de forma eficaz a todos esses indivíduos? Você sabe como lidar com essas pessoas?

Em uma metrópole como São Paulo, a mobilidade urbana sempre está em pauta, e quando essa conversa se transfere para o contexto da pessoa com deficiência, as coisas se inserem dentro de vários obstáculos e barreiras.

São Paulo possui acessibilidade?

Imagem: SinJusMG

“Há acessibilidade apenas nas regiões centrais, e mesmo assim é precária. As regiões periféricas não são nem um pouco acessíveis., contou Heloísa Rocha, 35 anos, jornalista e com uma doença rara chamada Osseogênese Imperfeita, que tem como principal característica a fragilidade óssea, e, além disso, possui também algumas malformações pelo corpo e uma escoliose muito acentuada. Devido a sua condição física, Heloísa precisa usar uma cadeira de rodas para se locomover, já que não consegue sustentar seu próprio peso.

Para a jornalista, a barreira arquitetônica ainda se mostra muito forte a respeito da qualidade de vida da pessoa com deficiência. “As calçadas são ruins, não há número de rampas suficiente, os pisos táteis não estão em todas as regiões da cidade, falta semáforos e o transporte público não está totalmente preparado”, disse Heloísa. 

A falta de cuidado com as condições arquitetônicas urbanas demonstra certo esquecimento das necessidades das pessoas com deficiência, fazendo sua integração na sociedade ser mais difícil. “Uma vez na Avenida Paulista, sofri um acidente. Havia um buraco no meio da calçada, acabei não vendo, e caí da cadeira de rodas. Se é assim na Avenida Paulista, imagine nas regiões periféricas.”, explicou.

Ainda há preconceito?

Imagem:  Pexels.

“Eu me tornei invisível para as pessoas. Parece que quando perdi a visão dos olhos, os outros que pararam de me enxergar”, expressou Assis Ângelo, 67 anos, jornalista, escritor, poeta e cego. Assis perdeu a visão dos olhos – como sempre gosta de ressaltar – aos 61 anos, devido a um descolamento de retina, e a partir deste acontecimento, passou a “enxergar a vida com a memória e com a mente”. 

A deficiência muitas vezes é encarada com timidez, medo e pena. E esta falta de conhecimento faz com que o relacionamento e consequente inclusão da pessoa com necessidades especiais encontre mais um obstáculo para se estabelecer. “As pessoas não sabem lidar com uma pessoa com deficiência porque não convivem com pessoas assim. Têm vergonha, medo de machucar, quebrar”, contou Heloísa Rocha.

O preconceito ocorre então de forma implícita, escondido nos atos, olhares e tratamentos direcionados a pessoa com necessidades especiais, julgamento este que na maioria das vezes desconsidera a personalidade do indivíduo, colocando a sua deficiência em primeiro lugar. “Primeiro enxergam a cadeira de rodas, depois a mulher que sou”, disse Heloísa. Ao perder a visão dos olhos, o jornalista Assis acabou entrando em processo de depressão, pois se viu em uma condição na qual se encontrava sozinho e de certa forma abandonado. “Há descaso e falta de compreensão por parte das pessoas”, falou o jornalista.  

Com receio de se relacionar com a pessoa com deficiência, o estereótipo do “coitadinho” ou do “super-herói” acaba surgindo, julgamentos que no final das contas acabam não representando de forma verdadeira o que o indivíduo realmente é. “Eu sou uma boa jornalista porque estudei, não por causa da minha condição física”, disse Heloísa.

E o mercado de trabalho?

Como consequência da barreira social, há dificuldade de inserção da pessoa com necessidades especiais no mercado de trabalho, sendo raros ou ausentes os casos de alcance de cargos de certa imponência, como gerentes, por exemplo. Apesar do estabelecimento da Lei de Cotas – que dentro de um número de funcionários de uma empresa estipula as porcentagens que devem ser de pessoas com deficiência – o tratamento destes indivíduos permanece de forma desigual. 

“Muitas vezes contratam uma pessoa com deficiência apenas para ‘cumprir o que a lei de cotas demanda’”, contou Heloísa. As vagas na maioria das vezes exigem baixa escolaridade e não implicam num crescimento da pessoa com deficiência dentro da empresa. E mesmo aqueles que conseguiram construir carreiras a partir do ensino superior, enfrentam obstáculos para conquistar vagas de trabalho dignas.

“Existem pessoas com deficiência com formação superior e boas experiências que mesmo assim enfrentam dificuldades no trabalho. O principal problema é a falta de oportunidades e acessibilidade, salários baixos e ausência de plano de carreira”, disse Lais Yasunaka, 37 anos, graduada em Letras-Libras pela Universidade Federal de Santa Catarina e em Editoração – Comunicação Social pelas Faculdades Integradas de Rio Branco, assessora parlamentar da Senadora Federal Mara Gabrilli e surda.

Qual a importância das redes sociais?

Imagem: Pexels.

 “Nas redes sociais não há barreiras, lá as pessoas com deficiência passaram a ter mais voz.”, disse Heloísa Rocha. A dinâmica do funcionamento das redes sociais conseguiu aproximar pessoas e criar espaços nos quais se comunicassem, compartilhando experiências, opiniões e dificuldades. Com isso, o movimento em prol dos direitos e inclusão da pessoa com deficiência se mostra com certa representatividade e força.  

Apesar da característica de aproximação, as redes sociais são conhecidas por possuírem as chamadas “bolhas”, ou seja, a troca de ideias dentro um grupo fechado de indivíduos que possuem mesmos interesses e pensamentos. “A camada de pessoas com alguma deficiência é muito heterogênea, composta por uma mistura de grupos. Acaba-se ficando em blocos, pois são discursos diferentes e necessidades diferentes para cada deficiência.”, esclareceu Heloísa. 

O que precisa mudar?

“O preconceito não nasce com a pessoa, ele é adquirido dentro de casa, através de valores que se passam desde a infância”, falou Heloísa. Essencialmente, o preconceito é gerado devido à falta de contato e diálogo com as pessoas com alguma deficiência. Dessa forma, o ambiente escolar serviria como um pilar fundamental para se promover a inclusão da pessoa com necessidades especiais desde cedo. “As crianças precisariam estar em contato com pessoas com deficiência desde novas, para entenderem que não é tabu, não é anormal. Faz parte da vida”, explicou a jornalista Heloísa.

Devido à falta de acessibilidade, a pessoa com necessidades especiais na atualidade ainda se mostra muito tímida, e na maioria dos casos, dependente da família. Nesta situação, a sociedade possui um papel importante no quesito de incentivo a emancipação da pessoa com deficiência, mostrando-a seus direitos e deveres como qualquer outro cidadão, coisa que ela o é. 

“Não é para tratar como coitadinho, são pessoas muito capacitadas”, disse o jornalista Assis Ângelo. A permanência dos olhares infantilizados e sempre baseados na visão clínica acabam funcionando com uma trava, um obstáculo perene que só faz com que estes indivíduos mantenham-se a margem do ambiente social no qual deveriam estar totalmente incluídos.

De fato, muita coisa já mudou, mas muito mais ainda precisa ser mudada. Incluir uma pessoa com deficiência na sociedade não gira em torno apenas da bondade, do respeito para com essa pessoa, e sim engloba muito mais fatores. A pessoa com necessidades especiais deve ser vista como um igual, um indivíduo com gostos, interesses, preferências e opiniões. E como qualquer outro cidadão, possui o direito de participar ativamente do ambiente social, e para isso, necessita de sistemas que o acolham de forma eficaz. 

Apesar de ser diversa, multicultural e sem parada, São Paulo se mostra amigável apenas para alguns. Mesmo sendo uma metrópole e importante centro econômico e industrial, a capital paulista precisa mudar, se mover e se modificar muito mais ainda para se declarar como uma cidade de todos os paulistanos que a habitam.

Hello! My name is Maria Antônia and I'm a journalism student at Cásper Líbero University. Art lover, especially for music and photography. A huge interest in cultural journalism and everything related. Curiosity, engagement and scowl are surely characteristics that can almost define myself.
Giovanna Pascucci

Casper Libero '22

Estudante de Relações Públicas na Faculdade Cásper Líbero que ama animais e falar sobre séries.