O cenário brasileiro está bastante caótico. Com a instauração de uma crise política, econômica e sanitária em meio a pandemia do novo coronavírus, as tensões tornaram-se ainda mais latentes. Como se não bastasse, a ascensão de ideais fascistas – frequentemente debatidos desde o período eleitoral de 2018 – ganhou força e forma. Indo contra as ideologias da extrema direita, os grupos antifascistas voltaram às ruas com um papel crucial.
Tal clima de insatisfação foi construído, também, a partir das constantes ameaças e posicionamentos negligentes tanto por parte do Presidente da República, Jair Bolsonaro, quanto por seus apoiadores. Desde o princípio, a situação foi tratada com descaso e simplificada a uma “gripezinha”, o que fortaleceu o discurso negacionista e intensificou as consequências da pandemia. Em Brasília, houve também a convocação de atos antidemocráticos que pediam intervenção militar e o fechamento do STF (Supremo Tribunal Federal). Diante das circunstâncias, a população se perguntava qual seria a gota d’água capaz de gerar uma onda de protestos por todo o país.
Iniciadas ao final do mês de maio, as manifestações de caráter antifascista possuíram diversos motivos para seu surgimento. Em entrevista concedida ao Her Campus Cásper Líbero, a ativista Laura Sabino explica como as falas do presidente impactaram diretamente no número de infectados e mortos pela COVID-19 no Brasil. “Abertamente contra o isolamento social e impedindo o avanço da proposta do auxílio emergencial, Bolsonaro deixava claro que se preocupava mais com os prejuízos dos grandes empresários do que com a vida da população”. Além disso, Laura ressalta a importância dos protestos internacionais antirracistas e contra a violência policial, que, de uma forma ou de outra, impulsionaram os movimentos organizados por parte da sociedade civil brasileira.
Nesse período, indivíduos pertencentes aos mais diversos espectros políticos passaram a compartilhar na internet o símbolo antifascista com cores e dizeres diferentes do original. É importante apontar que, ser contrário ao Bolsonaro não significa, necessariamente, ser contra o fascismo. A ativista explica: “O movimento “fora Bolsonaro” é pontual e plural. Boa parte dos grupos e partidos políticos que hoje defendem a saída dele foram – e não podemos esquecer – coniventes com suas falas”.
A respeito da modificação identitária do símbolo, o pensamento é de que “as cores vermelha e preta simbolizam, respectivamente, o comunismo e o anarquismo. A ação antifascista é, portanto, um movimento historicamente anticapitalista que buscava combater as ideias fascistas na cultura alemã e na burocracia partidária, por meio de agitação, propaganda, ações diretas e, não raro, conflitos diretos com fascistas e nazistas. Historiar o movimento e compreender sua importância é, de certo modo, evitar o esvaziamento das pautas, pois é como se, a partir disso, o antifascismo se tornasse tudo e ao mesmo tempo nada”.
Entretanto, por mais que as manifestações estejam alcançando uma assiduidade e solidez, o perigo do coronavírus ainda assombra a população. O Brasil é considerado o epicentro da doença e já alcançou mais de 50.000 mortes até a publicação desta matéria. Para Laura, “é importante compreender que, estar nas ruas é um ato de resistência à necropolítica bolsonarista, mas permanecer em casa também é. No entanto, isso não significa que as manifestações não sejam legítimas. Muito pelo contrário, uma das bandeiras dos atos foi a necessidade de investimento no SUS (Sistema Único de Saúde), bem como a necessidade do mercado de produzir luvas, álcool em gel, respiradores e a revogação da PEC do Teto de Gastos que sufoca os investimentos em pesquisa nas universidades federais. Além disso, o movimento negro foi protagonista nos atos e eles traziam consigo, além das denúncias sobre a violência policial, a de que a população negra é a mais afetada pelo vírus tanto em número de mortes quanto pelo desemprego provocado pela crise. Inclusive, nesse sentido, compreender a interseccionalidade das lutas pode nos ajudar a enxergar que as opressões são relacionais e não podem ser dissociadas.”, explica.
Em manifestações tão abrangentes e atuais, a desmistificação de termos e a busca incessante pelo não apagamento da história são essenciais. A responsabilidade para que símbolos e ideias não sucumbam, juntamente com a confluência entre as diferentes pautas referentes à realidade da população de acordo com os recortes sociais também faz parte do objetivo final dos manifestantes. Afinal, a banalização leva à fraqueza e não é isso que eles pretendem.
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O artigo acima foi editado por Laura Ferrazzano.
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