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No Banheiro Feminino: Resenha De “Gloria Allred: Justiça Para Todas”

This article is written by a student writer from the Her Campus at Casper Libero chapter.

Gloria Allred é uma famosa e polêmica advogada norte-americana, conhecida por opiniões que desafiam o patriarcado e por defender grandes casos envolvendo direitos das mulheres, que colocam em xeque a ideia de poder dos homens dentro da sociedade estadunidense – e, quem sabe, do mundo. O documentário Gloria Allred: Justiça para todas (em inglês Seeing Allred. 1h36) foi lançado em pleno 2018 e discute a vida da advogada através de sua atuação feminista e dos casos mais polêmicos defendidos por ela ao longo dos anos que confrontaram grandes personalidades do país, incluindo o próprio presidente em exercício, Donald Trump.

Em uma mistura de cenas atuais e mais antigas, a personalidade de Allred é debatida nos noticiários com opiniões fortes e divergentes que questionam sua credibilidade como advogada assim como seu desejo por poder e atenção. Nessas pontuações, divididas em comentários por entre as cenas do documentário, o medo do patriarcado por uma mulher poderosa fica latente: Allred é, sim, agressiva em seus argumentos; ela nunca demonstrou medo em afirmar o direito das mulheres ou mesmo do movimento LGBT+ em uma época (não tão antiga assim) que esses direitos não eram sequer pensados.

Allred leva os debates sobre a repressão ao seu núcleo nevrálgico e, até mesmo, de formas que não eram pensadas antes. Essa atuação ativa leva à grandes críticas – agressivas ou irônicas – sobre sua personalidade: “ela só está interessada no dinheiro”; “ela tem um pacto com diabo”; “mas, você sabe, onde está Allred, alguma coisa deve ser mentira”.

O documentário mostra, de forma clara, a dura luta de mulheres que desejam obter poder e prestígio em sociedades dominadas por aqueles que têm: poder e prestígio. E, em 1h30, ele também mostra como a advogada escolhe fazer isso da maneira mais ousada possível, sem medo de expor e se expor, ao entender que, dentro da sociedade onde vive, “poder só compreende poder”.

Image Source: IMDb

Com destaque fundamental, os casos de abuso sexual envolvendo o ator e comediante americano Bill Cosby, que começaram a ser denunciados por volta de 2015, inspiraram grandes movimentos feministas, inclusive entre atrizes, como o #MeToo, e chacoalharam Hollywood de forma jamais vista. Gloria representava 33 de 50 acusadoras, vítimas de estupros por parte de Cosby, e Seeing Allred apresenta toda a narrativa dos casos desde quando as primeiras mulheres chegaram à advogada com o desejo de iniciar um processo contra o ator.

Ao analisar o caso, Gloria percebe que um julgamento através das vias normais é quase impossível: o poderoso Estatuto das Limitações proíbe os casos de serem levados à corte uma vez que o período de tempo estabelecido para que uma vítima entre com um processo já foi ultrapassado.

Mas isso não impede Allred, que decide usar um caminho bastante comum para ela: a mídia. É interessante como a advogada reconhece o poder do discurso midiático para, além de tornar um caso público, remexer a opinião da sociedade e revelar suas falhas. E, Allred, apesar das críticas massivas que recebe dentro desse mesmo meio, consegue usá-lo de forma muito persuasiva. Com as primeiras denúncias de abuso contra Cosby, reveladas em uma entrevista coletiva organizada por ela, mais vítimas começam a aparecer. A sociedade americana e o mundo param: um dos atores mais amados das décadas de 70 em diante se torna um dos seus maiores inimigos. O caso é longo, os debates são inúmeros e a dúvida quanto à credibilidade das acusações, incansáveis. Apesar de o caso não ser o foco principal do documentário (e, sim, a vida e atuação de Allred), é possível entender sua extensão e impacto nas discussões sobre abuso sexual, que são impulsionadas em grande parte do mundo (o julgamento de Cosby, inclusive, traz à tona outros casos de personalidades famosas acusadas do mesmo crime).

Para além disso, a atuação de Allred no caso se estende para confrontar o mesmo Estatuto das Limitações, que, no estado de Nevada, por exemplo, limitava em quatro anos processos contra crimes de ataques sexuais ou, na Califórnia, em dez anos. O Ato por Justiça às Vítimas levou à tribunais norte-americanos questionamentos quanto à validade desses limites. Algumas vítimas e apoiadoras do ato afirmam que levaram anos para entender o crime que haviam sido vítimas, demorando 10, ou mesmo, mais de 40 anos para contar sobre o caso para alguém e procurar ajuda – choca ao saber que, algumas, nem sequer conseguiam chamar o ataque de um “estupro”.

Image Source: IMDb

Nessa disputa para estender o tempo de prescrição desses casos é possível perceber que crimes como o de abuso sexual podem levar anos para serem compreendidos por suas vítimas por diversos motivos: esses casos não eram tão discutidos antigamente e, por isso, muitas vítimas não conseguiam entender que haviam sido violadas; por outro lado, casos como esse, envolvem vergonha e um sentimento de humilhação que podem reprimir suas vítimas.

No Brasil, a PEC 353/2017 também levou para discussão, na Câmara dos Deputados, a imprescritibilidade em casos de estupros – já considerados, pela Constituição, como crimes hediondos. Atualmente, o tempo de prescrição pode se estender até 20 anos. É difícil deixar de pensar que a discussão não foi influenciada pela polêmica do caso nos Estados Unidos. E Seeing Allred vocaliza de forma ampla, através da vida de Gloria, a necessidade de manter o debate vivo e, mais ainda, a necessidade de enfrentar com todas as ferramentas possíveis o que ela mesma chama de “guerra contra as mulheres” ainda tão forte na sociedade.

Contudo, o documentário peca por não deixar claro certas tramitações dentro da legislação norte-americana. Para leigos no assunto (principalmente para aqueles fora da sociedade estadunidense) fica difícil, em alguns momentos, entender os caminhos necessários e sua importância para concretização dos processos e mesmo do embate ao Estatuto das Limitações. Apesar disso, o discurso e a vida de Gloria deixam claros o poder de mulheres unidas para enfrentar as repressões e, tudo com uma premissa muito simples: Segundo Gloria e suas clientes e apoiadoras, no banheiro feminino é onde a revolução começa.

Journalism student and, currently, Social Media intern. I am in love with literature, beauty, traveling, meeting new places and, definitely, a Youtube addict!
Anna is a 21 year old from Sao Paulo, Brazil, who studies Journalism at Casper Libero University. She’s currently the Editor in Chief of Her Campus CL's Chapter and is pretty obsessed with fashion, beauty and (trashy) reality TV shows.