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A Ascensão dos Negros Incomoda?

This article is written by a student writer from the Her Campus at Casper Libero chapter.

No dia 12 de setembro de 2018, o Coletivo Negro Estudantil AfriCásper realizou, no Teatro Cásper Líbero, o evento de  quatro anos de sua existência, onde abordou a questão: “a ascensão dos negros incomoda?”. Mediada pelo Professor e Analista Socioeconômico (IBGE) Jefferson Mariano, a mesa reuniu profissionais negros que são referência nas áreas em que atuam: a Executiva, Fundadora da Empregueafro e Especialista do programa Encontro com Fátima Bernardes, Patrícia Santos; a Jornalista e ex-Editora de beleza da revista Cosmopolitan, Paola Deodoro; o CEO e Fundador da agência de publicidade New Vegas, Ian Black; a Psicóloga, CEO e Fundadora da Blackrocks, Maitê Lourenço e o CEO e Fundador do Rap Burguer, Fernando Cândido.

Ana Carolina Pinheiro, aluna de Jornalismo e integrante do Africásper, abriu o evento agradecendo a presença de todos e dedicando-o à Valéria dos Santos, advogada negra que foi algemada e presa após exigir acesso à contestação do processo de um cliente no Juizado Especial de Duque de Caxias no dia 10 de setembro. Logo após a abertura, houve uma intervenção artística, onde o cantador Renato Pessoa, natural de São Paulo,  filho de Dona Madalena e Sr. Laércio, encantou aos presentes com duas músicas autorais: PARA PARA e Vôo, criadas a partir de suas vivências na cena poética e marginal paulistana, que falam, respectivamente, sobre liberdade e aprendizado. Ao terminar, Renato expressou sua felicidade em ocupar o espaço acadêmico, além de afirmar que considera a música e educação as únicas ferramentas transformadoras numa sociedade violenta. 

Patrícia Santos iniciou a mesa-debate: a profissional contou que quando começou a trabalhar na área de RH, aos 20 anos, notou que havia poucas pessoas negras nas entrevistas e precisava fazer algo a respeito. “54% da população é negra e, quando olhamos as estatísticas das grandes empresas do país, não têm 6% de negros na liderança”. Ela então conheceu um coletivo de estudantes negros na Fatec, o Fatec Afro, e foi incentivada a criar um projeto de empregabilidade – e dali nasceu a Empregueafro. Algum tempo depois, recebeu o convite de uma multinacional para ser consultora do programa de diversidade racial: o que antes era uma militância pessoal se tornou a primeira Consultoria de Recursos Humanos focada na Diversidade Étnico-Racial do país. 

Créditos: Aline Bernal

Ian Black apontou a importância da maioria do coletivo ser composto por mulheres, questionou as pessoas negras sobre as dificuldades ao se inserirem socialmente e enfatizou o autocuidado que deve haver dentro da militância, que muitas vezes custa a saúde mental de quem está atuando. “Devemos explorar esses espaços estrategicamente e nos preocupar em transformar mais o coletivo. É importante se incomodar com a falta de pessoas pretas no legislativo porque isso afeta as políticas públicas.” 

Já Maitê Lourenço afirmou que fundou a Blackrocks para que pessoas negras que querem criar algo tecnológico e inovador tenham mais acesso a esse meio. “Me sentia desconfortável ao ir em eventos voltados para inovação e startups e ver um número maior de pessoas brancas. Ascensão é valorizar quem veio antes,  a história, existe uma dívida com o povo negro”. Em entrevista anterior ao evento, Maitê lembrou que as mulheres baianas foram as primeiras empreendedoras, vendendo comidas e levando produtos e serviços até às pessoas. Para ela, a representatividade é essencial em tudo o que consome e suas inspirações são mulheres como Conceição Evaristo, que inclusive se candidatou à cadeira 7 da Academia Brasileira de Letras, e Shonda Rhimes. Mas, principalmente, sua mãe Ivete e suas tias, Idê e Sebastiana. “Hoje estou muito voltada à concepção de relações. Precisamos nos conectar à nossa ancestralidade e saber que podemos ter o outro como parceiro, é acolhedor.”

Nascida em uma condição social diferente da maioria das outras pessoas negras, Paola Deodoro destacou que, desde cedo, quase sempre era a única negra nos lugares em que convivia. “Minha avó conseguiu fazer suas 3 filhas entrarem em universidades, a mais velha cursou medicina”. Gaúcha, começou a trabalhar no Zero Hora; tinha um interesse enorme por moda e fez uma carreira no Sul. Posteriormente, estudou em uma grande escola de design no exterior e quando retornou ao país, mudou-se para São Paulo para alcançar o sonho de trabalhar em revista. Trabalhou em quase todas e, em novembro de 2017, foi chamada para ser Editora de beleza da Cosmopolitan, cargo que exerceu até mês passado, quando a revista anunciou o encerramento de suas atividades no Brasil. “As pessoas negras estão sendo vistas como bonitas e para mim é uma honra fazer parte desse movimento. A gente gera muito dinheiro e tem o poder em nossas mãos”. Uma pesquisa feita pelo Ministério Público de São Paulo revelou que pessoas negras movimentam R$ 800 bilhões anualmente.

Com o objetivo de envolver rap e gastronomia, Fernando Cândido havia saído do Sebrae por corte de funcionários e decidiu investir na sua ideia: em agosto de 2017 inaugurou o Rap Burguer, primeiro estabelecimento dedicado ao rap no Brasil. Ele contou que pessoas brancas frequentemente perguntam se ele contrata somente pessoas negras, já que elas são a maioria de seus funcionários. “Pessoas brancas não estão acostumadas a não serem protagonistas”. Durante uma conversa após o evento, Fernando também revelou o desejo de aumentar e consolidar o Rap Burguer, até ele se tornar tão prestigiado quanto o Hard Rock Café.

Créditos: Aline Bernal

Dando continuidade ao evento, o mediador Jefferson Mariano ressaltou a importância dos convidados estarem compartilhando suas experiências diante de um contexto complicado em relação à ascensão do negro e abriu espaço para as perguntas. 

“A população negra ganha metade do que os brancos no Brasil hoje; as famílias negras são as que mais ocupam favelas, e a maioria dos trabalhadores negros não possui carteira assinada. Que contribuição podemos dar aos jovens?”. Em resposta, Patrícia e Ian constataram que os negros precisam ser os melhores no que fazem para que sirvam de inspiração. “É necessário contrapor os processos tradicionais das empresas, e criar soluções inovadoras valorizando o olhar da população negra, que se atenta a questões ignoradas por outras pessoas. A jovem Rosângela da Silva se deparou com a ausência de bases para o seu tom de pele e criou A Negra Rosa, uma marca de beleza que atende aos diversos tons de pele negra”, completou Maitê. 

O ex-gerente de comunicação da Abril, presente na plateia, trouxe como reflexão a história da contratação da primeira estagiária negra na área em 60 anos, a aluna Ana Carolina Pinheiro, que mudou sua visão sobre ter pessoas negras na equipe. Elogiou sua excelência profissional, que fez com que ela ganhasse uma coluna dentro da revista Capricho, chamada “O nosso lado da história”, na qual trata de questões raciais e empoderamento. Após a merecida salva de palmas à aluna, Patrícia Santos falou sobre a importância das pessoas brancas reconhecerem seus privilégios e darem oportunidades às pessoas negras. 

A noite encerrou-se com a pergunta que não poderia faltar, do ex-casperiano Douglas para a convidada Patrícia, a respeito das dificuldades que ela encontra no mercado de trabalho com a Empregueafro. “A maior resistência que eu enfrento é com o gestor, porque ele acaba contratando pessoas por afinidade. Por isso é tão importante a criação de programas como o 20/20, projeto criado pela J. Walter Thompson, que almeja preencher, até 2020, 20% do quadro de funcionários de áreas estratégicas da agência com pessoas negras.”

Descubro quem eu sou entre uma escrita e outra.
Anna is a 21 year old from Sao Paulo, Brazil, who studies Journalism at Casper Libero University. She’s currently the Editor in Chief of Her Campus CL's Chapter and is pretty obsessed with fashion, beauty and (trashy) reality TV shows.